Quando a jornalista brasiliense Marcela Franco, 31 anos, era criança, ela estranhava o fato de o pai Antônio Cândido Osório Neto ter nascido em Brasília. Isso porque o advogado é alguns dias mais velho que a cidade. O homem completou 63 anos no último 8 de março, enquanto a cidade idealizada por Juscelino Kubitschek chega à idade em 21 de abril.
“Era difícil imaginar onde ele vivia, porque na minha cabeça não existia nada aqui. Era bem estranho, porque na minha convivência eu era a única pessoa que tinha um pai nascido em Brasília”, lembra. “Hoje eu acho muito massa e entendo que minha família é pioneira. Acho que isso nos tornou muito apaixonados pela cidade”, completa Marcela, que tem dois filhos, também nascidos no quadradinho, Antônio, 4, e Bernardo, 1.
O que era estranheza naquele período, agora é realidade em Brasília. Segundo dados da Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (PDAD) 2021, realizada pelo Instituto de Pesquisa e Estatística do Distrito Federal (IPEDF), 55,5% da população brasiliense correspondem a pessoas nascidas no DF.
“Não são só as estatísticas que mostram esse crescimento expressivo da população em mais de 60 anos. Quando Brasília começou, haviam registradas oito cidades satélites e hoje são contabilizadas 35 regiões administrativas. Essas mudanças podem ser consideradas muito rápidas”
Jusçanio de Souza, coordenador de Pesquisas Socioeconômicas do IPEDF
A ascensão dos brasilienses de origem entre os moradores da cidade começou em 2013, quando o número de nascidos aqui começou a se aproximar ao de provenientes de outros estados do Brasil. A quantidade passou em 2018, com os naturais do DF superando os demais, se tornando 55,3%.
“As duas últimas PDADs já apontam uma diferença próxima de 5% entre essa população [nascidos e migrantes]. Em 2018, o número era de 1,5 milhão, enquanto em 2021, já somavam mais de 1,6 milhão no universo de uma população de três milhões. Vemos um crescimento. Já somos maioria… posso dizer assim porque também me incluo nesse contingente”, destaca o coordenador de Pesquisas Socioeconômicas do IPEDF, Jusçanio de Souza, que também é brasiliense e completa 63 anos no mesmo mês que Brasília.
“Não são só as estatísticas que mostram esse crescimento expressivo da população em mais de 60 anos. Quando Brasília começou, haviam registradas oito cidades satélites e hoje são contabilizadas 35 regiões administrativas. Essas mudanças podem ser consideradas muito rápidas”, afirma o coordenador.
Novas gerações
O coordenador Jusçanio e o advogado Antônio Cândido fazem parte do seleto grupo de 0,6% da população habitante que nasceu em Brasília e que vai assoprar 63 velinhas em 2023. “Na minha faixa de idade, eu tive poucos amigos brasilienses. Mas depois, aos poucos, fui tendo amigos mais jovens que já eram nascidos aqui. Todos os meus irmãos também são nascidos em Brasília, assim como meus quatro filhos”, relata o advogado, que é filho de casal pioneiro: o gaúcho Antônio Carlos Elizalde Osório, o primeiro advogado de Brasília, e a goiana Natanry Osório, que vieram para Brasília em 1957.
Já a família de Melissa Maia, 22 anos, retrata a história desse aumento da população genuinamente candanga que aconteceu com o passar dos anos. A estudante e os filhos Alice, 5, e Ícaro, 1, integram a parte dos moradores da cidade que elevam o índice de nascidos no DF. Em suas faixas etárias, eles correspondem a 10,2%, 10,2% e 11,3% da população natural de Brasília, respectivamente.
Os filhos de Melissa já são de uma terceira geração brasiliense. A avó deles, Karla, 48, também nasceu no quadradinho – e hoje faz parte da faixa etária que equivale a 4,5% desta população –, num período em que os nascidos começaram a ser mais comuns. “Como eu nasci nos anos 2000, eu sou de uma geração em que as crianças já tinham pais de Brasília. Para mim, era comum. Eu achava estranho quem tinha pai e mãe de fora”, comenta a jovem.
Mais do que ser uma família de origem no DF, os Maias gostam de manter as tradições da cidade vivas por gerações. Melissa lembra que gostava de ir ao Parque da Cidade brincar no foguetinho e nos brinquedos do Nicolândia e também de ir ao shopping. “São muitas lembranças que com certeza eu quero levar para os meus filhos. Já virou tradição, por exemplo, levar minha filha ao bloco de carnaval Baratinha. E eu quero continuar os levando aos locais que remetem a Brasília, como a Torre de TV, com a qual Alice ficou encantada”, revela.
Perfil dos brasilienses
Entre os migrantes, no topo das origens dos moradores está Minas Gerais (15,5%), seguida de Bahia (11,9%), Goiás (11,9%), Maranhão (11,6%) e Piauí (11,4%)
Dos 55,5% dos habitantes de Brasília que são nascidos no Distrito Federal, a maior parcela da população está entre as pessoas de 0 a 24 anos. “Na medida em que vai se distanciando, com idade mais avançada, vai reduzindo o percentual dos naturais de Brasília e vice-versa”, revela Jusçanio de Souza.
Há equilíbrio entre homens e mulheres. Mas há distinção quando se trata de cor. A maior parcela desse grupo é composta por pardos (47,1%) e brancos (41,6%), em menor quantidade estão os pretos (9,7%), amarelos (1,35%) e indígenas (1,35%).
Em relação aos migrantes, se percebe uma diferença no índice de escolaridade. “Temos um contingente expressivo de nascidos com nível superior ou superior incompleto. Temos um perfil elevado que se distancia da média do país”, revela o coordenador do IPEDF. Entre os naturais do DF, 42,1% têm ensino superior completo e 9,1% superior incompleto, contra 32,6% com superior completo e 4,1% com superior incompleto entre os não nascidos.
Já entre os migrantes uma característica marcante são as origens dos moradores. No topo está Minas Gerais, com 15,5%, seguida de Bahia (11,9%), Goiás (11,9%), Maranhão (11,6%) e Piauí (11,4%).
Fonte: Agência Brasília