Atuação como docente da Escola Classe 316 Sul é a primeira experiência profissional da professora Sara Borges
Lívia Barros, Ascom/SEEDF
Transformar as dificuldades enfrentadas em superação e inspiração. Essa foi a escolha de Sara Borges, 37 anos, professora da Escola Classe (EC) 316 Sul, ao escolher a pedagogia como profissão. Diagnosticada com transtorno do espectro autista (TEA), nível 2, ela só desenvolveu a fala depois de 10 anos, mas, hoje, utiliza a voz em sala de aula para mudar a realidade de outras crianças e conscientizar os estudantes sobre o bullying e a exclusão, um dia sofridos na própria pele.
Sara se recorda de uma infância e juventude marcadas pela marginalização por causa de suas limitações. Para ela, a sociedade ainda tem um olhar de exclusão para as pessoas com deficiência. A professora quer mudar essa situação na realidade que ela pode alcançar, dentro da sala de aula.
“Eu sofri muito bullying e agressões durante toda a minha infância e juventude e isso me impactou muito. Não tive um professor que me acolhesse, mas eu cresci e quis fazer diferente. Quero que meus alunos acreditem que eles podem ser o que quiserem. Eu quero inspirá-los“, comenta Sara.
O trabalho como professora da rede pública de ensino do DF, na EC 316 Sul, é o primeiro emprego de Sara. Aos 37 anos, ela realiza o sonho ao dar aula para uma turma do ensino fundamental com crianças de 9 e 10 anos. “A diretora dessa escola foi a primeira pessoa que me disse sim na vida. Em outros empregos, me mandavam para casa quando viam minha condição. Ela acreditou em mim e eu coloco todo meu amor aqui para meus alunos”, conta.
Inspiração dos colegas
A diretora da EC 316 Sul, Cláudia Madoz, relembra como foi receber a profissional para integrar o corpo docente da unidade escolar. “Recebê-la foi emocionante. O desejo de todos os professores de alunos com TEA é levar o aluno onde ele quer chegar. Levá-lo a ser o profissional que ele deseja ser. E ela está sendo um exemplo para os estudantes e seus familiares, desmistificando rótulos criados pela nossa sociedade muitas vezes preconceituosa”, ressalta Cláudia.
A gestora elogia as aulas criativas e reflexivas dadas por Sara. “Eu trabalho com educação especial há muitos anos e a cada dia ela nos surpreende com seu trabalho, onde os alunos são levados a ter uma visão crítica sobre o contexto da sociedade atual na qual estão inseridos“, comenta.
Projetos inclusivos
Sara começou a dar aula na Escola Classe 316 Sul no início do ano letivo de 2024, mas já soma muitos projetos realizados em parceria com os colegas neste tempo. Na Semana Distrital da Conscientização e Promoção da Educação Inclusiva aos Alunos com Necessidades Especiais, no início de março, realizada em toda a rede pública de ensino do DF, Sara promoveu várias ações para os alunos.
Em uma delas, os alunos colocaram um adesivo na boca e eram incentivados a se comunicarem sem a fala, para entenderem um pouco como os mudos se comunicam. Em outra atividade, imobilizaram o braço que escreviam e refletiram sobre a rotina de uma pessoa com deficiência em tarefas diárias como ir ao banheiro, encher a garrafinha de água e escrever somente com uma mão.
As atividades foram aprovadas pelos estudantes. “Eu gostei de me colocar no lugar de uma pessoa com deficiência. Nenhuma pessoa deve ser excluída, todas as crianças merecem fazer amizades”, comenta Ricardo Pedroza, 9 anos, aluno da turma da Sara. “Não importa se a pessoa tem ou não deficiência, ela quer ser respeitada, como qualquer outra”, completou a estudante Marina de Oliveira, 9 anos.
Protagonismo dos estudantes
Sara acredita que as crianças aprendem de forma dinâmica e, com esse objetivo, desenvolve projetos em que as crianças são protagonistas no processo de aprendizagem. Um deles foi uma atividade em que a professora levou uma caixa de papelão e pediu que os alunos se agrupassem e decidissem o que fazer com ela.
O intuito era incentivar a escuta. Assim, eles tiveram que desenvolver habilidades de organização, persuasão e divisão de tarefas. O resultado foi a construção de um castelo. “Eu fiquei calada durante a aula, eles que decidiram tudo, se organizaram, definiram as tarefas e me apresentaram o resultado que ficou lindo”, comemora Sara.
As ideias para estimular o desenvolvimento dos alunos vêm de dentro de casa. Sara é paraibana e, desde que recebeu o diagnóstico de TEA nível 2, sofreu perdas, inclusive a convivência com a mãe, que escolheu não lidar com as limitações da filha. Hoje, Sara é casada e mãe de três filhos, de 15, 13 e 8 anos, sendo que dois deles também já foram diagnosticados com TEA.
“Eu sou uma mãe inclusiva, então desde que meu primeiro filho nasceu, há 15 anos, eu apresento o mundo de forma que brilhe os olhos dele. Eu quero que ele viva de forma prazerosa, então é natural, para mim, desenvolver projetos inclusivos. A gente não precisa de pena ou de dó, a gente precisa de espaço para se desenvolver”, pontua.