Antes da construção do canal de irrigação do Núcleo Rural Córrego das Corujas, no Sol Nascente, não havia cultivo que sobrevivesse à seca. “Só plantávamos em época de chuva, senão a produção morria”, lembra a produtora rural Adriana Souza Nolasco, 48.
Dois anos após a entrega da tubulação, a realidade mudou consideravelmente: “Não dava para plantar muita variedade, só o que não precisava de irrigação constante e diária; com o canal, isso mudou. Hoje em dia, planto banana, graviola, tamarindo, mexerica, limão, abacate, acerola”.
Adriana é agricultora familiar e mantém contrato com o governo federal por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). “Antes do canal, eu só tinha plantações de banana para consumo próprio”, conta. “Hoje tenho 600 covas, cada uma com três pés, com perspectiva de aumentar a plantação, e entrego de 200 kg a 400 kg para o programa mensalmente. Tenho a certeza de que, se eu precisar pegar um empréstimo em um banco para investir na minha propriedade, vou poder pagar, porque tenho produção para esse fim. É a realização de um sonho: posso plantar e colher da minha terra”.
Com extensão de 5,25 km, o canal de irrigação do Núcleo Rural Córrego das Corujas atende cerca de 50 produtores rurais, incluindo Adriana, e foi construído a partir de emenda parlamentar do deputado Chico Vigilante no valor de R$ 260 mil. Adriana comemora: “O canal mudou muito não só a minha vida, mas também a dos meus vizinhos. Foi a conquista de um sonho antigo. Agora temos a garantia de plantar e saber que a plantação não vai morrer, porque podemos irrigar”.
Ritmo acelerado
Desde 2019, o Governo do Distrito Federal (GDF) já investiu R$ 15.892.611,32 na construção de 29 canais de irrigação. O valor é referente à compra dos tubos feitos com polietileno de alta densidade (PAD) e policloreto de vinila (PVC). O benefício chegou a 758 produtores rurais que, com a tubulação, têm mais segurança para trabalhar e empreender. Ao todo, os canais construídos somam 84,34 km de extensão. Houve também a manutenção e reforma de 45 km de canais.
Assentamento Márcia Cordeiro Leite recebeu, em outubro, um canal de cerca de 11,5 km que atende mais de 30 famílias
Atualmente, estão em construção os canais da Lagoinha, no Capão Seco, que tem 800 metros de extensão e beneficia 15 produtores; um trecho de Tabatinga, em Planaltina, que soma 100 metros e atende a 36 produtores, e o canal principal do Rodeador, em Brazlândia, com extensão de 8,6 km e potencial para beneficiar mais 93 produtores. Em 16 de outubro, foi entregue o canal de cerca de 11,5 km que atende 31 famílias do Assentamento Márcia Cordeiro Leite, em Planaltina. A obra custou R$ 350 mil, recursos originários de emendas parlamentares.
Construídos anteriormente com manilhas de concreto ou no próprio leito da terra a céu aberto, os canais sofriam com perda de cerca de 50% do volume de água. Havia infiltração do recurso hídrico no solo e interferência da natureza, como a queda de galhos e folhas. O cenário para os produtores era de insegurança: não sabiam se a água chegaria à propriedade nem se o que chegasse seria suficiente para manter a irrigação das plantações.
A construção dos canais conta com a união de esforços entre o governo e a população. A Secretaria de Agricultura do Distrito Federal (Seagri) fornece o maquinário usado na obra. Já a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do DF (Emater) é responsável pelo projeto e acompanhamento técnico. Aos moradores da comunidade, cabe construir as caixas de distribuição de água em suas propriedades.
Prioridade
O secretário-executivo da Seagri, Rafael Bueno, ressalta que a demanda dos canais é considerada prioridade desde 2019. Ele adianta que há tratativas com órgãos e entidades federais para ampliar ainda mais o número de canais revitalizados ou reconstruídos.
“Esse empenho é muito importante, uma vez que a água, que estava se perdendo por infiltração e evaporação, hoje está sobrando nos riachos e para o produtor”, aponta. “Muitas propriedades que estavam secas, assim como no Assentamento Márcia Cordeiro e no Núcleo Rural Capão Seco, passaram a contar com essa água.”
O assessor técnico da Emater Edvan Ribeiro afirma que, além do efeito econômico, o esforço apresentou impactos sociais e ambientais. “Com o canal, a água que antes era desperdiçada passa a ser utilizada nas plantações e o que sobra volta para os mananciais”, detalha. “Do ponto de vista ambiental, garantimos as condições de trabalho adequadas para a população rural. Tem produtor que passou dez anos sem receber água, principalmente aqueles que estão no final do canal. Alguns tinham perdido a esperança, e hoje contam com água diretamente na propriedade.”
Segundo Ribeiro, que é responsável pelo mapeamento dos canais, oito estruturas têm a previsão de ser tubuladas no próximo ano. No total, o DF conta com 65 canais de irrigação, somando mais de 235 km. “Começamos pelos principais canais, que atendem a um número maior de produtores, mas a meta é chegar a todos”, assegura.
Impacto geracional
Construído em 2022, o canal de irrigação do Núcleo Rural Ponte Alta Norte, no Gama, significa recomeço para os 24 produtores atendidos. A tubulação foi instalada com aporte de R$ 150 mil.
O aposentado Geraldo Conceição Lopes, 61, conta que, sem a garantia da água, grande parte dos moradores abandonaram as plantações. “O canal era a céu aberto; então, na época da seca, a água evaporava muito”, recorda. “A gente ficava receoso de começar uma produção, a água acabar e a gente perder tudo”.
“Agora, a gente tem confiança de poder investir em mudas ou em um projeto mais pesado que exija fazer a irrigação de forma mais criteriosa”Marileuza Andrade, produtora rural
Tão logo foi sanado o desperdício do recurso hídrico, a água passou a chegar diariamente à propriedade dele e à da vizinha, a aposentada Marileuza Andrade, 62. O canal permitiu que a produtora rural plantasse café, das espécies catuaí-amarelo e vermelho. O cultivo começou no ano passado, quando foram colhidas oito sacas. Para o próximo ano, a meta é dobrar o resultado.
“Agora, a gente tem confiança de poder investir em mudas ou em um projeto mais pesado que exija fazer a irrigação de forma mais criteriosa”, comenta a produtora. “Antes era uma instabilidade muito grande, e depender do poço artesiano era muito dispendioso, pois precisávamos de mais energia elétrica. Estamos pensando em novos projetos com a Emater, que sempre está presente com assistência técnica. O projeto do café tem sido bem interessante e traz novos desafios, desde como colocar o produto no mercado até a melhor forma de descascar as sementes.”
Já Geraldo aposta no cultivo de limão e almeja que a produção seja autossustentável, para não precisar trabalhar de outras formas e poder bancar um intercâmbio de estudos para a filha. “Este será o primeiro ano em que vamos produzir de verdade”, diz. “Nesse ano que passou, consegui colher oito sacos de limão de 15 kg cada, e foram vendidos rapidamente. Minha intenção é progredir, cultivar a terra, aumentar os frutos e ganhar mais dinheiro.”