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Educação antirracista exige mudança completa do sistema de ensino, afirmam especialistas

23/11/2023 – 20:49  

Renato Araújo/Câmara dos Deputados

Comissão se reuniu nesta quinta-feira

Após 20 anos da vigência da lei que obriga as escolas a ensinar história e cultura africanas e indígenas, a educação brasileira continua fundamentalmente voltada a valores europeus, sustentaram participantes de debate na Câmara. Para os especialistas, construir uma educação antirracista requer a reformulação completa dos sistemas de ensino, que passa pela formação dos profissionais da educação.

Segundo o professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro Amilcar Araújo Pereira, a construção do sistema educacional, na primeira República, utilizava a perspectiva europeia com o objetivo de “embranquecer a população”. E, conforme Amilcar Pereira, essa concepção não ficou no passado: continua em vigor nas escolas e universidades brasileiras.

“Na Europa, em geral, na Inglaterra, na França e na Espanha, pelo menos, que são os casos que eu estou estudando mais de perto, se estuda menos história europeia do que no Brasil. Na UFRJ, nas universidades brasileiras em geral, se dedica muito mais espaço curricular a estudar a história da Europa que os próprios europeus fazem, numa população majoritariamente negra”, afirma.

Coordenador-geral de Promoção da Cidadania e Combate ao Racismo do Ministério dos Povos Indígenas, André Baniwa ressaltou que, com relação aos povos indígenas, a prática oficial foi de negar a existência dessa população. Segundo disse, o Estado “pretendia, por muitos métodos, que um dia não houvesse mais indígenas no país”.

Povos indígenas
Para Baniwa, uma forma de reparação à população indígena por essa trajetória de violência seria contar essa história da maneira como ela realmente aconteceu. Para isso, segundo ele, é preciso ter coragem do poder público.

“Isso é consciência; para a gente não repetir e construir o futuro, isso é fundamental. Há registros históricos para fundamentar o que aconteceu com os povos indígenas, a violência – muitas etnias foram dizimadas, as línguas também -, porque havia gente afirmando que nós não tínhamos alma, então, podia-se fazer qualquer coisa com os povos indígenas. Então, não era violência, então não era crime, então não era pecado. Eu chamo atenção para que esses materiais didáticos sejam corajosos para deixar isso muito claro”, ressalta.

Uma reivindicação dos indígenas, conforme André Baniwa, é a criação de um sistema nacional de educação dos povos indígenas.

A deputada Célia Xakriabá (Psol-MG), inclusive, relatou ter estudado em uma escola indígena, onde, segundo disse, teve “a grande felicidade” de nunca ouvir dizer que quem descobriu o Brasil foi Pedro Álvares Cabral. A deputada informou que está preparando um projeto de lei para proibir que as escolas ensinem essa versão da história brasileira.

A professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo Iracema Santos do Nascimento relatou que a maioria dos professores da educação básica que ela orienta na pós-graduação não teve nenhuma formação sobre cultura africana ou indígena. Ela ressalta, porém, que a formação dos profissionais da educação é importante, mas representa somente o primeiro passo na construção de uma escola antirracista.

“A educação antirracista, para ser efetiva, implica uma mudança radical na escola, nas relações, nos comportamentos. Ela exige uma nova ética dentro da escola, nos materiais, no projeto político-pedagógico, na formação dos profissionais e dos familiares também”, aponta.

Na concepção da deputada Professora Luciene Cavalcante (Psol-SP), a construção de uma sociedade democrática e menos violenta só será possível com uma educação antirracista. Professora Luciene Cavalcante foi quem pediu o debate, realizado na Comissão de Educação.

“Não dá mais para a gente continuar assassinando a grande maioria da nossa juventude e normalizando isso. Por que não há uma revolta com relação a tanta injustiça e a tanto racismo e exclusão, um País tão rico e ao mesmo tempo com milhares de pessoas passando fome? Porque isso nos foi ensinado por uma elite. Isso é possível quando eu tiro a humanidade das pessoas. Porque, se eu compreendo o outro como humano igual a mim, eu não fico passivo diante de uma violência ele está sofrendo”, afirmou.

Na opinião da deputada, a escola é o espaço privilegiado para promover essa mudança de mentalidade por constituir o local de conformação do modo como as pessoas interagem com o mundo.

Reportagem – Maria Neves
Edição – Ana Chalub

Fonte: Agência Câmara de Notícias

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