08/10/2021 – 18:32
Participantes de audiência púbica promovida nesta sexta-feira (8) pela Comissão Mista Permanente sobre Migrações Internacionais e Refugiados afirmaram que a crise migratória que o mundo vive foi aprofundada pela pandemia de Covid-19, mas que a doença não pode servir de justificativa para que direitos humanos básicos sejam negados aos que necessitam de asilo e refúgio.
Segundo Jan Jarab, representante regional do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, os refugiados foram particularmente afetados durante a pandemia pois, muitas vezes, trabalham no setor informal, não tiveram acesso às políticas governamentais de mitigação da crise econômica provocada pela pandemia e foram forçados a retornar aos seus países de origem.
Direitos humanos
Federico Martinez, representante adjunto do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, ressaltou que rechaçar a entrada de refugiados de forma indiscriminada, sob o pretexto da pandemia, viola normas internacionais de direitos humanos.
Luis Macedo/Câmara dos Deputados
Gadêlha: situação do Afeganistão chamou a atenção para problemas no Brasil
Ele também destacou que os países que mais recebem refugiados no mundo, ao contrário do que se poderia esperar, não são os mais ricos, mas sim os vizinhos daquelas nações de onde mais se deslocam pessoas.
“Cinco países respondem por 67% do deslocamento transfronteiriço no mundo: a Síria, com quase 7 milhões de pessoas fora da Síria; a Venezuela é o segundo maior país com população deslocada no exterior; Afeganistão, com mais de 2,5 milhões; Sudão do Sul com 2,2 milhões; e Mianmar com mais de um milhão. A enorme maioria dos refugiados no mundo é hospedada por países vizinhos e de baixa ou média renda. A Turquia acolheu a maior população de refugiados do mundo, 3,7 milhões; Colômbia, 1,7 milhões; Paquistão, Uganda e Alemanha, com mais de um milhão por país”, relatou.
O relator da comissão, deputado Túlio Gadêlha (PDT-PE), quer ouvir o ministro das Relações Exteriores, embaixador Carlos Alberto Franco França, sobre dificuldades que refugiados encontram no Brasil.
“A situação do Afeganistão vem servindo de cenário mundial para uma discussão mais ampla sobre migrantes e refugiados, e a partir dela a gente também percebeu as dificuldades que o nosso governo tem provocado para receber as pessoas que precisam desse visto humanitário. Queremos um esclarecimento sobre essas dificuldades”, disse.
“Governança migratória em xeque”
Defensor público e coordenador do Grupo de Trabalho Nacional para Migrações, Apatridia e Refúgio na Defensoria Pública da União, João Freitas de Castro Chaves criticou a atual governança migratória brasileira.
“A governança migratória no Brasil está em xeque e responde mal a esses desafios. Por exemplo, não há um processo legal na concessão de vistos, o que envolve o Ministério das Relações Exteriores. Não há, por parte do Ministério da Justiça e da Polícia Federal, modelos de flexibilização de exigências e de melhoramento do atendimento: hoje é praticamente impossível agendar um atendimento para requerer autorização de residência”, aponta. Segundo ele, até mesmo a emissão de CPF para migrantes irregulares foi dificultada. “O CPF, que é porta de entrada para direitos e serviços públicos no Brasil, hoje é inacessível para migrantes indocumentados.”
“Territórios inabilitados para a vida”
Para Angela Facundo, professora do departamento de Antropologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, a atual crise migratória não é produto do acaso, mas sim um projeto de um planeta que está “mais interessado no lucro do que na vida”.
“A expansão agroindustrial, extrativista de exploração ilimitada dos territórios e seus habitantes está inabilitando esses territórios para a vida, além da crise climática que vai destruir boa parte dos territórios habitáveis no futuro. Se o nosso objetivo hoje é nos preocuparmos com os efeitos terríveis da migração forçada, me parece que temos que ocupar nossa mente com as suas causas. Por isso, o tema da migração e do refúgio não pode ser discutido de maneira separada, por exemplo, do tema dos direitos quilombolas, indígenas e dos territórios de populações tradicionais em geral.”
A comissão, formada por senadores e deputados, foi criada em 2019 e tem como missão fiscalizar e monitorar questões que tratem de movimentos migratórios nas fronteiras do Brasil e dos direitos dos refugiados.
Reportagem – Paula Bittar
Edição – Ana Chalub
Fonte: Agência Câmara de Notícias