A terceira edição da Caminhada do Silêncio, realizada neste domingo (2) na capital paulista, relembrou o golpe civil-militar de 31 de março de 1964, homenageou a memória das vítimas da violência, e pediu o fim da impunidade dos crimes cometidos por agentes estado brasileiro durante a ditadura.
O ato teve início na Praça da Paz, no Parque Ibirapuera, e se deslocou até o Monumento em Homenagem aos Mortos e Desaparecidos Políticos, em frente ao parque. “A mensagem é impunidade nunca mais. O Brasil provou nos últimos quatro anos que é um país que não superou ainda o seu passado. É um país que está marcado pela violência, porque nunca processou de forma adequada os seus processos de violência”, disse Rogério Sottili, diretor executivo do Instituto Vladimir Herzog, uma das instituições que organizou o ato.
“Nós queremos que os responsáveis pelos genocídios, responsáveis por mortes, desaparecimentos forçados, de torturas, sejam responsabilizados. Essa é a única forma de a gente superar, virar esta página da história, e o Brasil avançar para uma cultura de paz, o Brasil avançar para uma democracia dia plena”, acrescentou.
No gramado da Praça da Paz, foram dispostas fotografias, acompanhadas de flores, de cerca de 70 pessoas mortas ou desaparecidas pelo aparelho de estado durante a ditadura. Entre os homenageados, Maria Lúcia Petit, Antônio Carlos Nogueira Cabral, Aurea Eliza Pereira, e Jane Vanini.
Faixas estendidas cobravam o cumprimento de recomendações da Comissão Nacional da Verdade: “Desmilitarização das polícias”, “Fim do genocídio da população indígena e negra”, e questionavam o posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a lei de Anistia: “Anistia para torturador? Só o Brasil tem. STF ainda garante impunidade”.
A procuradora regional da República, Eugênia Gonzaga, presente no ato, lembrou que a lei de Anistia ainda é usada pelas instituições brasileiras para livrar da punição os agentes do estado que cometeram crimes durante a ditadura. De acordo com ela, essa leitura da lei foi moldada pelos militares desde a sua criação.
“A anistia no Brasil foi negociada, a transição do governo da ditadura para o governo democrático foi completamente negociada e controlada pelos militares. E isso plasmou na cabeça das pessoas, das instituições, que era para se virar essa página, e não fazer a punição”, disse.
“Esse caminho foi completamente errado. Não é um caminho que leva ao amadurecimento da democracia, e é um caminho que leva a repetição das práticas. Nós ainda estamos nessa luta. O Supremo Tribunal Federal até hoje não reviu o posicionamento de aceitar a lei da anistia para os torturadores também. Mas, aos poucos por judiciário vem mudando a sua posição”, acrescentou.
O ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, destacou que a importância do ato está em relembrar o passado para não repeti-lo no presente. “Quando a gente fala dos jovens que morrem nas periferias de São Paulo e do Brasil inteiro, da violência policial presente, nós estamos falando, portanto, desse passado que não passou”, disse.
“Estamos fazendo hoje esse ato de memória para que possamos construir um futuro em que essa violência não ocorra de novo, e para que essa violência não repercuta como tem repercutido na vida de cada um de nós. Nós vimos isso nos atos que aconteceram agora no dia 8 de janeiro, nós vimos nos quatro anos que nos antecederam a esse, ou seja, eles são resultados direto de um país que não consegue lidar com seus traumas”, acrescentou.
A partir desta edição, o evento passou a fazer parte do calendário oficial da cidade de São Paulo, incluído pela lei 17.886 de 2023. A 3ª Caminhada do Silêncio foi organizada pela Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania e pelo Movimento Vozes do Silêncio, composto por dezenas de entidades.
Fonte: Agência Brasil